quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

(52) A Escarpa...

"A seu lado, ela caminhava silenciosa, esboçando um misterioso sorriso enquanto desciam a custo a escarpa que dava acesso à praia. Curioso olhava a forma ágil como ela evitava os obstáculos da escarpa, do alto dos seus sapatos de salto generoso. Pretendiam assistir de perto aquele concerto instrumental, do marulhar das águas ainda sonâmbulas. 
A sinfonia das ondas chegava aos seus ouvidos como um sopro de liberdade. As ondas penetravam a areia e depois voltavam para o mesmo lugar, placidamente. Sentia-se parte das notas daquela sinfonia, esquecendo qualquer dor, qualquer saudade, qualquer amor...
Chegaram. Ela poisou os delicados pés na fina areia da praia; os sapatos vermelhos, com aquela rosa sobre o peito do pé ondulavam na sua mão, ao lado da sua sombra esculpida pelo sol ainda meio encoberto e desenhada na areia. Resolveram sentar-se para sentirem um maior contato com a Terra. Os finos e longos cabelos dela dançavam numa bela desarmonia, seguindo a vontade do vento. O sol tentava soltar-se das amarras das nuvens teimosas e os seus raios entrelaçavam-se nos cabelos rebeldes.
Silenciosamente olhava-a. Abriu os braços para o mar, sentiu os pés afundarem-se na areia molhada...
Um vastíssimo mar azul estava à sua frente.
Menina irrequieta, levantou-se e sulcando a areia ainda húmida da praia, percorreu silenciosamente aquele espaço que os separava da linha de água, onde as ondas se fragmentavam e as espumas chocavam com os rosados e frágeis dedos dos seus pequenos pés. Tudo era paz de espírito…
O vai e vem das ondas ia atirando pequenas conchas na areia. Sentia-se conquistado pela sua beleza. Uma conchinha porém chamava a sua atenção. Assustadoramente carismática e encantadora, despertava nele o desejo de levá-la para a mesinha da sua vida e fazê-lo sonhar, desejar, viver intensamente e acreditar como a imensidão do mar.
Deitados agora na areia, estrategicamente separados por uma distância de segurança, pensavam nas coisas que a vida em vão os fazia perder. Pensamentos que voavam e os levava ao infindo sem causa e mundos quiméricos. Pequenas viagens supersónicas ao centro do subconsciente em busca da razão da sua existência.
Silenciosamente sorria. E bastou uma palavra dela, para que ele deslizasse sobre a areia e repousasse a cabeça sobre o seu abdómen, enquanto de olhos fechados, sentia a sua respiração ofegante e a sua pele quente…
E perdidos na memória dos seus passos, foram deixando as ondas para trás. Ainda tinham que subir aquela escarpa…"