quarta-feira, 25 de outubro de 2017

(67) Ausência e Abstinência...

Ela sabia o que fazer. O seu coração dizia-lhe que ele estava a passar por momentos muito duros. Momentos como os que ela já passara por ele e que foram dias de tormenta. Não hesitou. Sentou-se frente ao portátil e com as mãos trémulas pela emoção e pela saudade que ainda apertava o peito, escreveu:
"Meu querido, 
Tens que dizer a ti próprio:“Vou desaparecer. Fazer com que sinta a minha falta”. Embora essa seja uma artimanha arriscada, é uma das únicas que pode dar certo. De vez em quando o único remédio é sair de cena para o show continuar. Aprender a ser ausência quando tudo já foi dito, cobrado, explicado. Deixar de ser insistência para ser abstinência. Controlar os próprios impulsos pode parecer simples, mas é uma das coisas  mais difíceis de se conseguir. Tanta alegria lá fora e tu teimando em te fixares na pessoa que te abandonou. É preciso entenderes que enquanto perderes tempo a ver os horários em que “visualizou por último” no WhatsApp, muita vida está a acontecer lá fora e a ser deixada para trás.
É claro que no início vai ser mais difícil. Não é de uma hora para a outra que o coração entende as mudanças de planos e estações, mas aos poucos, bem aos poucos, aprendes a fazer falta. Desaparece do mapa de quem sabe onde te encontrar e até ao momento não se importou; para quem teve todos os teus sorrisos e nunca os valorizou. Sai de cena de quem tu ouviste inúmeros “nãos” e nunca acreditou; de quem pouco se relacionou e muito se cansou. Do afecto pequeno que tanto te recusou e tu sempre aceitaste. Desaparece do mapa de quem vive com dúvidas e nunca te teve como certeza; de quem não aprendeu a remar junto contigo na tua luta e agir com gentileza. Aprende meu querido a fazer falta para quem já se habituou à tua presença e desaprendeu de sorrir quando tu te  aproximavas. 
Para quem se esqueceu como é boa a tua companhia e prefere refugiar-se numa vida fria, onde não tem horizontes, os horizontes que tinhas para ela. Fazer falta é segurar o impulso de procurar, vasculhar, perguntar. É conter a vontade de entender o que não dá mais para explicar ou de justificar o que não merece absolvição. Fazer falta é não ligar, não mandar mensagens, não digitar o tal endereço na barra de contactos do e-mail. 
É sair para te distraíres com os amigos, dar uma corrida no parque, respirar fundo e encontrar sentido na solidão. É rezar para o pensamento acalmar, não entrar no perfil dela do Facebook, deixar de postar as tuas próprias fotos com a intenção de seres visto à distância. 
É desistir de parecer bem, é cortar o cabelo para renovar o espírito, é ficar bem longe do telemóvel enquanto tomas um copo de cerveja ou uma taça de champanhe. É, acima de tudo, agir com esquecimento para quem te quis esquecer. Torço para que tu meu querido, consigas desaparecer. Para que, desaparecendo, ela descubra se realmente fazes falta. Para que, desaparecendo, ela descubra o quanto a tua presença é importante ou não. Desaparecer é uma estratégia arriscada, eu sei. Mas também define muita coisa mal resolvida. Também traz as respostas que buscamos e nem sempre encontramos. Nem sempre as respostas serão aquelas desejadas, mas no fim vão libertar-te para prosseguires com mais certeza, clareza… e amor próprio.
E estarei sempre aqui..."