terça-feira, 5 de dezembro de 2017

(68) Reencontro...desencontro...

Aquele encontro no final de uma tarde fria, em que ela o convidara para lanchar, era a confirmação de tudo que procurara durante anos e que encontrara naquela reunião um ano antes. Os seus olhos eram os mesmos...Sim...os mesmos olhos tristes que vira naquele palácio, outrora noutra vida, quando fora expulso e teve que deixar a sua Princesa...
Dias depois deste reencontro, num aperto de nostalgia, pegou num papel e escreveu: 
"Sei que esta talvez tenha sido a última vez que te vi. Num turbilhão de emoções que me inundam a mente, sinto-me ser levado pela maré. Não quero, quero voltar a estar contigo nem que seja apenas mais uma vez. No canto do olho uma lágrima teimosa escorre-me pela face, salgada, ardente, dolente...com este papel, é como se acenasse com um lenço branco de adeus...”
Curioso era o que ela lhe escrevera a propósito daquele reencontro: 
“Quando estivemos juntos senti uma vontade imensa de te abraçar. Lembro-me desse pormenor mas não entendi ...realmente algo de estranho que senti...Tive medo”.
Ele respondeu-lhe: 
“Nem imaginas como quando te vi afastares-te naquele jardim, naquela tarde fria, me apeteceu gritar: Volta...preciso contar-te a minha vida".
Passou mais um ano. Tantas horas em que lhe apeteceu voltar a vê-la...
Mas não acreditava. Mais forte: não queria acreditar. Um “Amo-te...” é como chave de prisão. Entra-se e não se sabe se algum dia se sai. Até que naquele dia a viu chegar. Com um brilhozinho nos olhos... cada um tinha feito um novo amigo. 
Ao longo deste tempo foram juntos aos infernos de cada um sem soltarem a mão do outro. Brincaram virtualmente como adolescentes... e sentiram saudades da “outra vida” e até do que ainda não tinham vivido. Contaram sonhos. Contaram até os silêncios. E ele ficara muitas vezes em silêncio, quando as palavras se emaranhavam no que sentia e tinha medo que ela fugisse... 
Há um ano, tinham-se olhado nos olhos, profundamente, e sorriram. E aquela vontade de lhe agarrar a cabeça com uma mão e puxá-la para um beijo que continha todos os minutos até aí perdidos na vida... foi certeza, não foi carência. Foi entrega. Com resistência...
Quando a viu partir, interrogou-se: 
“E agora?'...” 
Quis gritar-lhe...sufocou...
Partira, olhando uma vez mais para trás e sorriu com aqueles lábios que ele tão bem conhecia. Ela queria abraçá-lo. Ele queria abraçá-la num anel de calor e protecção, para lhe dizer: 
“Agora, a vida recomeça. E fazemos dela o que quisermos”. 
Ela sorri...afinal... existia o “tal” Amor do passado... como amoras que nascem espontâneas e adoçam o Caminho...
Ele queria ficar ali... E as horas que se lixassem... e o mundo inteiro que parasse ou corresse, era indiferente...por uma fracção de segundo olhou-a na Luz crepuscular dos candeeiros do jardim e quis murmurar-lhe o desafio que fazia parte de si: 
“Anda...vem cá...vamos reencontrar-nos...”
Há milénios fizera-o guardião do seu sentir total... queria dar-lho. Queria que recuperasse a memória do Amor com toque de asa. E houve um momento em que lhe apeteceu dizer-lhe: 
“És tu que páras e me olhas nos olhos, incrédula e envolvida pelo espanto: - És tu? Não, somos nós...”
E o mundo recomeçou ali...
Há um ano, foi um daqueles dias que nos fazem tremer todas as certezas que acumulámos ao longo da vida... certezas que se tornam lixo... pois tudo começa ali, naquele momento, naquele olhar. Se há gesto que faz um homem render-se sem “mas”... é quando quem amamos nos puxa para ela... mão na nuca, com a firmeza do “eu quero-te”... Não aconteceu na verdade...
Amar é raro. Raríssimo. Mas quando nos abraça...tornamo-nos super heróis e tão humanos...