sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

(63) Marés...

"Sabia que aquela talvez fosse a última vez que a tinha visto. Num turbilhão de emoções que lhe inundavam a mente, sentia-se ser levado pela maré. Não queria, Queria voltar a estar com ela nem que fosse apenas mais uma vez. 
No canto do olho uma lágrima teimosa escorria pela face, Salgada, ardente, dolente..
Pegou num papel. Era como se acenasse com um lenço branco de adeus e nele gravou toda a sua amargura e saudade:

MARÉS

"Gravo com os pés figuras na areia,
Na tentativa vã
De alcançar o fundo da solidão,
Deixo os sonhos deslizarem pela mão
Vou deixar o destino serenar o coração.

Espero, luto, tento em vão,
Do céu, nada vem, nada cai!
Efémero capricho é este vivido!
Afogo os meus temores, a alegria se vai
Azedo desacerto este, que me faz sentir perdido!

Apagaram-se os riscos, o mar os levou,
A cada respiração, a cada arfar do peito
Ouço o bater do coração descompassado, que o tempo parece quase parou.
E é nesta minha luta de viver, sem jeito,
Onde o mar e os sonhos, 
são o meu castelo altivo,
Que, ergo a muralha, à maré em que vivo.

A onda espraia-se, 
E o meu pensamento leva e traz
E é neste tão doloroso penar, 
Onde fica o meu sossego!
Que, a esperança não morre, é de paz.
E volto de novo à vida, á força e ao apego.

Levarei avante, meu caminho até ao fim!
Com os pés na areia, gravo novas figuras,
E se a maré as levar, 
Não me levará a mim.
Ficarei só, esgravatando a areia,
Desenhando a vida, novos caminhos,
E do alto do meu castelo, na ameia,
Esperarei sereno, novos carinhos."

31-Jan-2017

Limpou uma última lágrima, não leu novamente para não filtrar as emoções, dobrou em quatro e guardou no bolso interior do casaco.
_ "Acho que é tudo ou nada" - lamentou em silêncio - "Talvez ela goste..."

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